segunda-feira, março 31, 2008

Historiografia comunista norte-coreana



"Este é o vídeo que passa na televisão norte-coreana, a KCNA TV, para contar ao povo a história fantástica da vida de Kim Jong-il. As legendas estão em inglês." - Encontrei o vídeo, e a legenda, no interessante blogue Coreia do Norte - Um segredo de Estado.

Os inimigos da liberdade de expressão

domingo, março 30, 2008

Tradição cruel

O vídeo mostra uma mulher acusada de ser bruxa na Índia e que por isso foi amarrada a uma árvore e espancada. Cortaram-lhe também bocados do cabelo. Em Timor coisas deste género também acontecem. Há tradições que têm que ser mudadas.




Acabemos com a violência contra as mulheres


Ramos Horta é um dos participantes numa campanha contra a violência doméstica que decorre em Timor-Leste. O Presidente da República de Timor-Leste foi no dia 11 de Fevereiro alvo de um atentado, mas está a recuperar bem e pensa regressar brevemente ao seu país. Ainda bem, Timor precisa dele.

sábado, março 29, 2008

Je t’aime moi non plus em Timor

Luís CARDOSOCrónica de uma travessia – A época do ai-dik-funam. Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1997, pág. 89

“Recrutavam então valores dispersos pelos aquartelamentos, metropolitanos e nativos, cantadores românticos e imitadores de bandidos, que abandonadas as espingardas, armados de viola e microfone partiam numa caravana, denominada artística, parecida com aquelas do farwest representadas nos livros de sete balas. Era certamente o único momento em que se podiam ouvir canções proibidas de uma tal Zeca Afonso – Grândola, vila morena – cantadas por oficiais estudantes. Viras, corridinhos e António Mafra – eram prà aí sete e picos – por soldados dos ranchos folclóricos da província e gemidos duma mulher imitados por um cantor, bas-fond das discotecas lisboetas, na tal música francesa, Je t’aime moi non plus.”


Luís CARDOSOThe Crossing - A Story of East Timor. London, Granta Books, 2000, p. 84 (Tradução de Margaret Jull Costa)

«It recruited anyone with talent, whether Portuguese or Timorese (who were occasionally to be found scattered throughout various barracks) – romantic singers and would-be bandits who laid down their rifles and, arming themselves with a guitar and a microphone, set off in a so-called artistic troupe, rather like one of those travelling shows in a pulp western. It was certainly the only time that people would hear banned songs by the likes of Zeca Afonso (Grândola, vila morena) sung by student officers, or popular songs and dance tunes and António Mafra (…eram prà aí sete e picos) sung by soldiers from provincial folk clubs, and a woman’s orgasmic moans imitated by a male singer, a frequenter of Lisbon discotheques, in a rendition of Je t’aime moi non plus


Luís CARDOSOUne île au loin. Paris, Éditions Métailiè, 2000, p. 84 (Tradução de Jacques Parsi)

“Ils recrutaient alors des gens de valeur, dispersés dans les casernements, métropolitains ou indigènes, chanteurs romantiques et copies de bandits qui, ayant abandonné le fusil, armés de guitare et de micro, partaient dans une caravane, appelée artistique, semblable à celle du Far West qu’on voyait dans le livre à deux sous. C’était sûrement le seul moment où l’on pouvait entendre les chansons interdites d’un certain Zeca AfonsoGrândola, vila morena – chantées par des officiers étudiants. Des viras, des corridinhos, et António Mafra – eram prà aí sete e picos, «Ils étaient à peu prés sept et quelques» - par des soldats des groupes folkloriques de la province et les gémissements d’une femme imités par un chanteur basfond des boîtes de nuit de Lisbonne, dans la fameuse chanson française Je t’aime moi non plus.”






Luís CARDOSOCrónica de uma travessia – A época do ai-dik-funam. Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1997, pág. 91-92

“O meu irmão Toni já falava bem inglês praticado em tarefas de voluntariosos e esforçado guia turístico. Formava uma dupla com Carlos Campara e ambos prometiam enquadrar-me no solícito feudo dos prazeres mundanos. Dizia um que a aprendizagem de qualquer língua partia sempre com rituais iniciáticos de actividades corporais. O outro complementava que gostava mais de falar com as camonas numa língua estrangeira como a francesa, E dizia je t’aime moi non plus, ficava por aí, com os olhos fechados. Depois concluía que o resto era latim, como quando os padres diziam a missa.”

Luís CARDOSOThe Crossing - A Story of East Timor. London, Granta Books, 2000, p. 87 (Tradução de Margaret Jull Costa)

«My brother Toni already spoke good English, acquired in his work as a headstrong, enthusiastic tour guide. He formed a duo with Carlos Campara and both promised to introduce me to the sweet domain of worldly pleasures. According to one, learning a language always began with initiation rites involving certain physical activities. The other added that he found it more enjoyable talking to women in a foreign language like French. He would say to me, ‘Je t’aime moi non plus,’ and then stop, his eyes closed. The rest, he concluded, was just Latin, like when the priests said mass.»


Luís CARDOSOUne île au loin. Paris, Éditions Métailiè, 2000, p. 86-87 (Tradução de Jacques Parsi)

“Mon frère Toni parlait déjà bien l’anglais, qu’il pratiquait dans son travail de vaillant guide touristique volontaire. Il formait un tandem avec Carlos Campara et tous deux promettaient de m’encadrer dans le monde désirable des plaisirs du monde. L’un disait que l’apprentissage de n’importe quelle langue débutait toujours par des rituels initiatiques d’activités corporelles. L’autre ajoutait qu’il aimait mieux parler avec les nénettes australiennes dans une langue étrangère comme le français. Il disait je t’aime moi non plus et, les yeux fermés, n’allait pas plus loin. Puis il concluait que le reste était du latin comme lorsque les prêtres disaient la messe.”

Cântico Negro

A Fátima Guterres e a Mónica Fonseca leram-me este poema (um dos meus preferidos) na festa de despedida que os alunos organizaram na faculdade lá na UNTL.





Cântico Negro
de José Régio (1901-1969)
dito por Maria Bethânia


"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...

A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe

Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...

Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?

Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...

Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.

Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...

Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...

Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.

Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!


[encontrado no já extinto Blog da Sabedoria Defunta]

sexta-feira, março 28, 2008

O Islão como uma religião de paz

Foi colocado na Internet o filme anti-Islão “Fitna” do deputado holandês de extrema-direita Geert Wilders. No YouTube aparece em duas partes, a primeira é uma sequência de imagens de atentados terroristas, crimes horríveis e apelos à violência feitos por fanáticos muçulmanos, e a segunda é uma tentativa de assustar os europeus com o aumento do número de crentes islâmicos na Europa. Ao longo do filme são citadas algumas frases do Alcorão, descontextualizadas, para tentar mostrar que esta é uma religião violenta. Poderia facilmente ter encontrado muitas citações da Bíblia cheias de crueldade também, o Antigo Testamento fala de cidades inteiras dizimadas, e será que isso faria de todos os cristãos pessoas desapiedadas? A Indonésia é o maior país islâmico do mundo, mas a grande maioria dos muçulmanos indonésios é gente tolerante e respeitadora. Aliás, muitos pais muçulmanos lá até continuam a dar aos filhos nomes hindus tradicionais do Mahabharata e do Ramayana como Arjuna, Brahma, Damayanti, Laksmi, Bima, Sinta, Krisna, Lestari, Dewi, Dewa, Larasati... Tenho muitos amigos que professam a religião islâmica e que são indivíduos com virtudes e defeitos como eu e tu que me lês, e que nada têm a ver com esta imagem que o senhor Geert Wilders deles tenta fazer passar. Parece-me que o problema é que o tempo de antena das televisões e a atenção dos jornais do mundo é normalmente para os fundamentalistas, sendo os moderados uma maioria silenciosa. Porém, há crentes que não querem continuar calados e pretendem ter um papel mais militante e mais visível contra o ódio e a intolerância, pessoas como Ziauddin Sardar ou a jovem Irshad Manji que aparece nesta entrevista:



Judo - O caminho da suavidade

Jacarandá em Lisboa

"Nas ruas de Lisboa, os jacarandás floriam como se a natureza não perdesse nunca a memória das cores. Como archotes, velavam pelo canto dos loricos, cacoaques e outros pássaros feridos, na época de ai-dik-funam."

Luís CARDOSO in "Crónica de uma travessia - A época do ai-dik-funam"
Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1997

"In the streets of Lisbon, the jacaranda trees were blooming as if nature had never lost its memory for colours. Like flaming torches, they kept vigil over the songs of the lorikeets, the cacoaques and all the other wounded birds, in the season when the coral tree flowers."

Luís CARDOSO in "The Crossing - A Story of East Timor"
London, Granta Books, 2000 (Tradução de Margaret Jull Costa)


"Dans les rues de Lisbonne, les jacarandas étaient en fleurs comme si la nature ne perdait jamais le souvenir des couleurs. Comme des torches, ils veillaient sur le chant des oiseaux de paradis, les loricos, les cacoaques et autres oiseaux blessés, à l'époque de l'ai-dik-funam."

Luís CARDOSO in "Une île au loin"
Paris, Éditions Métailiè, 2000 (Tradução de Jacques Parsi)



[Encontrei esta bonita fotografia no blogue Zoo, e foi também publicada numa bela sequência sobre os jacarandás de Lisboa no blogue Arboretto.]

quinta-feira, março 27, 2008

Mutilação genital feminina na Guiné e na Indonésia

O semanário português Expresso dá a notícia da divisão dos deputados do Parlamento guineense em relação à aprovação de uma lei para proibir a mutilação genital feminina no país. Fernando Gomes, fundador e antigo presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, é um dos parlamentares que tenta fazer passar a lei, contra a resistência dos que não querem mexer com a tradição. Em Portugal e noutros Estados europeus com comunidades imigrantes provenientes de países onde se mutilam ainda os órgãos genitais das raparigas é completamente proibido realizar tal prática. Esperemos que os dirigentes políticos da Guiné-Bissau tenham a coragem de pelo menos dar os instrumentos legais àquelas que se empenham na luta contra este flagelo. Mesmo com aprovação da lei ainda haverá um longo caminho a percorrer para mudar as mentalidades e os costumes.

A Organização Mundial de Saúde estabelece uma tipologia dos tipos de mutilação que vão dos menos radicais, que podem limitar-se à realização de um pequeníssimo corte ritual no clítoris só até fazer sair uma gota de sangue, até outros que incluem a remoção do capuz do clítoris, ou do capuz e do próprio clítoris, ou a amputação completa destes e dos lábios menores, até aos casos mais graves, da chamada infibulação, em que após a ablação os lábios maiores são cosidos quase em todo o comprimento deixando apenas um pequeno orifício para passagem da urina e do sangue mentrual.

Também na Indonésia se mantém ainda a tradição da mutilação genital. De acordo com um estudo de que se deu notícia no jornal Kompas, citado no blogue Indonesia Matters, 90% das mulheres indonésias são circuncidadas. O mesmo blogue aponta para um artigo do New York Times, de Janeiro passado, onde se fala num valor ainda mais elevado, 96%. Este jornal inclui fotografias de uma sessão de mutilação em massa (mais de 200 numa manhã) realizada em Bandung pela Fundação Assalaam, cujo responsável pelos serviços sociais diz que “há três ‘benefícios’ para as raparigas: um, estabiliza a libido delas; dois, vai fazer a mulher ficar mais bonita aos olhos do marido; e três, dá-lhes equilíbrio psicológico”.

Os direitos humanos são universais e há que continuar a trabalhar para que cheguem também a estas vítimas da tradição.

segunda-feira, março 24, 2008

Pequim 2008 e boicotes

Os acontecimentos recentes no Tibete vieram chamar a atenção da comunidade internacional para esta nação invadida pela China há mais de cinquenta anos. Alguns dos movimentos de solidariedade com o povo tibetano espalhados pelo mundo têm também apelado ao boicote aos Jogos Olímpicos, a União Europeia veio dizer que não vai boicotar, o Dalai Lama também diz que apoia a realização das Olimpíadas em Pequim e que espera que as ONGs aproveitem este período para lembrar o mundo da repressão na sua terra. Algum apoiante da autodeterminação do Tibete fez este desenho, que encontrei no blogue d”O Jumento”.

Em 1992 participei com timorenses e portugueses numa manifestação de apoio a Timor na Expo 92, em Sevilha. Andávamos com camisolas de manga curta pretas com um pequeno texto em que se perguntava se a Indonésia também mostrava na Expo os massacres que fazia em Timor-Leste. Depois de uma concentração nossa em frente ao pavilhão indonésio, a polícia espanhola levou-nos todos para as traseiras do edifício. Após algum debate foi negociado que não faríamos mais manifestações no recinto, mas que não seríamos expulsos de lá e poderíamos circular à vontade, mantendo as camisolas vestidas, claro. Acabei por ser interpelado por vários turistas e membros de delegações estrangeiras que queriam saber o que era isso de Timor.

Uns três anos depois participei num encontro de uma semana em Amesterdão de dirigentes de ONGs, associações e outras estruturas ligadas ao trabalho com jovens e com minorias étnicas. Falei bastante de Timor, evidentemente, e um dia uma moça da organização veio explicar-me que fazia parte do programa um jantar de todos os participantes num restaurante indonésio e ela queria saber se eu teria alguma objecção. Disse-lhe que em tempos Portugal tinha sido uma potência colonial que mantinha uma guerra para não permitir a autodeterminação das suas colónias e que se nesse tempo uma família de portugueses abrisse um restaurante em França, ou na Holanda, seria muito triste que o público boicotasse o seu estabelecimento por causa das opções políticas do regime de Salazar. Nunca fiz boicotes aos produtos indonésios, sempre me pareceram um bocado histéricas as reacções como as que houve por cá quando descobriram que a selecção (de futebol, se bem me lembro) usava camisolas feitas na Indonésia. Se fossemos coerentes nesse tipo de boicote teríamos que ir ler o relatório anual da Amnistia Internacional e boicotar os produtos de meio mundo.

Um boicote aos Jogos Olímpicos (como muitos países fizeram em diversas ocasiões, nomeadamente nos de Moscovo em 80 e nos de Los Angeles em 84) é uma coisa muito triste, é os políticos a quererem levar as suas querelas (que tantas vezes provocam guerras) para onde não devem. O desporto é uma área em que os indivíduos dos mais diversos povos, religiões, países, se podem encontrar e competir em igualdade de oportunidades, e mostrar o seu valor. As condições de treino podem ser díspares, os percursos de vida também, mas no tatami, na pista, no ringue, no campo, cada mulher e cada homem vale por si, e a determinação e empenho podem dar a todos a esperança de uma medalha. Um boicote às Olimpíadas seria uma colossal falta de respeito para com o esforço espartano dos atletas que se preparam há anos para esse momento. Dito isto, parece-me que nada obsta a que os apoiantes dos tibetanos invistam numa estratégia do tipo das camisolas de que eu falava acima, algo do género de convencer turistas, jornalistas, membros de delegações, técnicos, etc, a andar pela aldeia olímpica e por Pequim com camisolas evocando a situação no Tibete. Iniciativas dessas seriam mais um teste à tão propalada vontade das autoridades chinesas de mostrarem uma nova imagem, mais tolerante e democrática. Os apelos pelo Tibete da cantora Bjork num concerto recente em Xangai são um bom precedente.

domingo, março 16, 2008

Culturas mestiças, misticismos mestiços também

Em Timor existem diversos movimentos de natureza mais ou menos mística, como por exemplo a Sagrada Família e os Kolimau 2000, que normalmente incorporam elementos católicos com outros das tradições religiosas animistas locais. Tal fenómeno acontece também noutros lugares onde a história da ocupação colonial criou culturas nacionais que, como a de Timor-Leste, são mestiças.

No fotoblogue My Sarisari Store, um dos meus favoritos sobre as Filipinas, encontrei uma colecção muito interessante de fotografias de grupos místicos locais, incluindo Rizalistas, que transformaram o escritor e intelectual nacionalista José Rizal, fuzilado pelos espanhóis, numa figura sagrada. Uns consideram-no um santo, outros um profeta, alguns ainda uma reencarnação de Jesus Cristo. As fotografias mostram lugares onde a população diz ter havido aparições de Cristo, anting-antings (amuletos), peregrinos, curandeiros… Os timorenses reconhecerão conceitos que, tal como na sua terra, unem a raiz austronésica com o superestrato de uma língua neo-latina ibérica, como "inang miserecordia".

Nas Filipinas existe também em certos meios o costume de inserir pequenos objectos no corpo (“sona ai-moruk”, em tétum) para ficar mais forte ou invulnerável, como fazem em Timor grupos como os Sete-Sete. O malikmata de que fala o senhor no vídeo abaixo parece ser semelhante ao poder de matan-helik dos timorenses.



P.S. - Não tendo nada a ver já com misticismos, deixo aqui um link para um slideshow sobre cocos nas Filipinas. A minha mulher ao vê-lo disse imediatamente: - Mas isto parece Timor!

P.P.S. - Futu-manu (luta de galos) nas Filipinas. O galódromo de Bidau ainda não é tão sofisticado como o deles, que até tem bancada em anfiteatro, mas também é jeitoso.

E mais um P.S. - Se o vídeo de cima não funcionar tente esta versão:



sexta-feira, março 14, 2008

Ministry dos affairses extrangeiros

Há uns anos atrás publiquei no jornal timorense “Semanário” um texto em que falava sobre erros habituais na comunicação social na denominação em tétum dos ministérios do Estado timorense. Dava o exemplo do “*Ministériu Educasaun Cultura Juventude no Desporto”, em que a palavra “Ministériu” está escrita em tétum, “Cultura” em português e “*Educasaun” em língua nenhuma, porque em português seria “Educação” e em tétum “Edukasaun”.

Sendo o tétum uma das línguas oficiais de Timor-Leste deveria haver uma designação oficial das instituições do Estado também nesta língua. Tomemos agora como exemplo o “Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação”. Como designá-lo em tétum? Fui procurar nos meus arquivos designações deste ministério e/ou ministro.

STL,18-06-2003,p.6 – *Ministru Negosius Estrangeirus no Kooperasaun
STL,23-10-2003,p.6 – *Ministru dos Negosios Estranjeirus no Kooperasaun e, no mesmo texto, *Ministru Negosius Estranjeirus
STL,29-10-2003,p.1 – *Ministru Negosiu Estrangeiru no Kooperasaun
Jornal Nacional Diário,03-03-2006,p.7 – *Ministru dos Negocius Estranjeirus
Jornal Nacional Diário,22-03-2006,p.2 – *Ministru Negocius Estranjeirus no Koperasaun
Timor Post,11-05-2006,p.1 – *Ministru Negocios Estrangeiros no Cooperasaun

A versão bilingue do livro de António Veladas “Timór Terra Sentida” (Publ. Europa-América, 2001) chama-lhe “Ministériu Asuntu Li’ur nian”. Creio que este livro será leitura obrigatória nos estudos académicos que vierem a existir sobre a tradução em tétum, por ter sido uma das primeiras obras integralmente traduzidas para a língua, por ter usado já a ortografia oficial do INL e por a tradução ter estado a cargo de um dos mais importantes linguistas timorenses, o Professor Benjamim Corte-Real (curiosamente não há qualquer referência ao tradutor na ficha técnica). O tradutor que trabalha nestas circunstâncias é um pioneiro, um explorador que de catana na mão vai abrindo novos caminhos na selva virgem. Em idiomas com uma antiga tradição de tradução muito foi feito pelos que vieram antes, há que repetir apenas o procedimento, mas em línguas ágrafas, ou quase, ele vê-se na posição de ter que decidir qual a forma melhor para traduzir pela primeira vez uma dada expressão ou palavra. Nenhum tradutor de inglês, francês ou indonésio precisará de pensar duas vezes ao substituir “Ministério dos Negócios Estrangeiros” por “Ministry of Foreign Affairs” (1), “Ministère des Affaires Étrangères” ou “Departemen Luar Negeri”, mas o profissional consciente que trabalha com o tétum poderá ter que parar e reflectir antes de decidir qual será a melhor tradução possível. Na ausência de um nome oficial da instituição em tétum, os jornais timorenses frequentemente inventam, como já vimos. No "Lia Foun", um projecto bilingue pioneiro que existiu em 2005, houve uma decisão da redacção (tradutores incluídos) de manter os nomes oficiais em português dos ministérios mesmo nos textos em tétum, enquanto não houvesse decisão sobre as designações oficiais neste idioma, e também como forma de educar o público (afinal o português também é língua oficial do país e não merece ser mutilado como habitualmente é nos média de Timor-Leste).

Entretanto, enquanto pensava sobre estas questões, lembrei-me das brincadeiras que Umberto Eco faz com traduções e retroversões de textos clássicos no Babel Fish, no livro "Mouse or Rat – Translation as Negotiation" (Phoenix, 2004, p.10-18). Um dos textos que ele usa é constituído pelos sete primeiros versículos do Génesis de uma versão da Bíblia em inglês (a King James Bible), que ele depois traduz para diferentes línguas para mostrar alguns pontos sobre questões teóricas da tradução. Os resultados são, como seria de esperar, no mínimo estranhos. Então resolvi levar o Ministério dos Negócios Estrangeiros para o Babel Fish…

Traduzi primeiro “Ministério dos Negócios Estrangeiros” para inglês e obtive “*Ministry of the Foreign affairses”. Como não conhecia a palavra “*affairses” fui ao Google ver se havia quem conhecesse. 867 ocorrências, o que significa que há pelo menos este número de nabos na Internet. Uma delas é um comentário a uma notícia sobre Timor escrito por um autodenominado “Maubere” que andou a traduzir as suas opiniões para um monte de línguas, provavelmente no Babelfish também, e lá aparecem os “*affairses” rodeados de caracteres chineses (外国affairses的先生部长 葡萄牙语), o que mostra que o programa não reconhece as suas próprias criações lexicais. A seguir, pedi a tradução para português do “*Ministry of the Foreign affairses” e obtive “*Ministry dos affairses extrangeiros”. Comecei a achar que o Babel Fish tinha aprendido português nos jornais timorenses.

Lembrei-me então de ir lá com o “Ministério das Relações Exteriores” dos nossos irmãos brasileiros. Choque! O Babel Fish sabe o que é e apresentou de imediato a tradução para americano ver: “Department of state”. Fiz a retroversão e… “Departamento de estado”, que é como em português se chama o equivalente deste ministério nos EUA.

Tentei então em francês. Perfeito!

Ministério dos Negócios Estrangeiros>Ministère des Affaires Étrangères>Ministério dos Negócios Estrangeiros

Fui lá novamente com a designação brasileira, confesso que com uma esperançazinha de que o Babel Fish francês manifestasse por eles o mesmo desprezo que o seu congénere inglês mostrou por nós. Mas não, uma pequena discrepância apenas, normal nisto de máquinas de tradução burras.

Ministério das Relações Exteriores>Ministère des Relations Extérieures>Ministério das Relações Externas

Das duas uma, ou os franceses sabem mais de geografia e de relações internacionais do que os americanos ou então lembram-se de nós por causa das porteiras e mulheres-a-dias.

E a tradução para tétum, que é por onde tínhamos começado? Analisemos então os elementos do problema. Se optássemos, como tem feito a imprensa, por adaptar a designação portuguesa, haveria que ser coerente com a ortografia. Teríamos então “Ministériu Negósiu Estranjeiru no Kooperasaun nian” ou “Ministériu Negósiu Estranjeiru no Kooperasaun sira-nian”. Mas não fiquemos por aqui. Quais são os elementos que compõem o nome do ministério? “Cooperação” pode nalguns contextos ser traduzida por “serbisu lisuk”, mas aqui parece-me que “kooperasaun” não seria contestada por ninguém. “Estrangeiro” já é diferente, podemos falar em “tasi-balun”, “li’ur”, “rai-li’ur” (por oposição a “rai-laran”, “doméstico”, “interior”), “rain-seluk”,… O Dicionário de Tétum do INL usa o neologismo “makli’ur”, com recurso à morfologia tradicional do tétum téric, com o significado de “exterior” ou “externo”. Finalmente a palavra “negócio”, ou em tétum “negósiu”, que em Timor é usada mais no sentido económico, como sinónimo do termo indonésio “bisnis”, que ainda se ouve muito, e que pode no caso ser perfeitamente substituída por “asuntu”, como vimos acima. Daqui surgem várias designações alternativas possíveis, versões divergentes das formas portuguesas, como por exemplo:

Ministériu Asuntu Li’ur no Kooperasaun nian
Ministériu Asuntu Tasi-Balun no Kooperasaun nian
Ministériu Asuntu Rai-Li’ur no Kooperasaun nian
Ministériu Asuntu Makli’ur no Kooperasaun sira-nian
Ministériu Negósiu Makli’ur no Kooperasaun sira-nian

Como vê o meu caro leitor, a tarefa do tradutor é espinhosa, de partir pedra para abrir caminho, e seria de facto útil que o Estado aprovasse uma lista oficial com os nomes dos Ministérios e Secretarias de Estado em tétum. Mas não se pense que é preciso a toda a força encontrar denominações vernáculas que substituam os empréstimos lexicais do português. Numa aula em que discutíamos as opções dos puristas para o desenvolvimento do tétum, propus aos alunos que traduzissem sem usar palavras de origem portuguesa a seguinte frase, sabendo ser esta uma tarefa impossível:

A roda do meu carro tem um furo.

Várias vozes tentaram fazer a tradução em voz alta, evitando os termos “roda” e “karreta”. Então uma moça começou, pensando à medida que falava:
- “Ha’u-nia buat ne’e ne’ebé ema sa’e nia buat-kabuar iha kuak.
Quando terminou toda a sala explodiu numa gargalhada, e ela, compreendendo de repente a interpretação que estavam a fazer, ficou vermelha como um tomate. O que ela disse, numa tradução livre, foi algo como: “A minha coisa para cima da qual se pode subir (montar) tem uma coisa redonda que tem um buraco”. Às vezes é melhor usar os empréstimos lexicais mesmo…


(1) Ou “Ministry of External Affairs” ou “Ministry of External Relations”.

quarta-feira, março 12, 2008

Wikipédia em hakka

Também já há uma wikipédia em hakka, a língua materna dos chineses timorenses. A pesquisa é feita preferencialmente pelas palavras escritas numa forma de romanização, mas pode ser também pelos caracteres chineses (ainda que isso não funcione muito bem) porque muitas das definições enciclopédicas aparecem em duas colunas, uma em caracteres latinos e outra em caracteres chineses. Provavelmente esta última seria a maneira melhor, já que há muitos sistemas de romanização diferentes, além de que a representação em caracteres latinos das palavras também varia de acordo com as pronúncias das diferentes regiões (como em português há quem diga "vaca" ou "baca", "laite" ou "leti", etc). O problema para os chineses timorenses é que a maioria deles é analfabeta em chinês, porque os indonésios mandaram encerrar as escolas chinesas que havia no tempo dos portugueses. Talvez seja altura de reabrir alguma dessas escolas...
***
***
Procurando por 中國 [China] vamos ter a uma página que nos diz que há compatibilidade de 100% com Kôan-lièn-thu, 92.0% com Kôan-lièn-thu e 17.3% com Kôan-lièn-thu. O problema é que a primeira é a Mongólia, a terceira é aranha, e a segunda opção é que é a China.

Dias de silêncio e dias de celebração

O Nyepi, o dia de silêncio dos balineses foi no dia 7 de Março (ou 8, conforme as versões - eu não estava lá...). Em Timor-Leste não há Nyepi mas alguns malais têm andado a protestar na blogosfera porque o estado de sítio também estraga as jantaradas e idas à discoteca. Entretanto, aproxima-se a Páscoa (פסחא) e provavelmente o estado de sítio será levantado para o povo poder participar nas cerimónias religiosas.

Mas a propósito de Nyepi... será que há algum timorense hindu? E havendo, terá ele direito a pedir que esta data passe a ser feriado oficial? Afinal, o Lebaran (عيد الفطر/Eid ul-Fitr) e o Idul Adha (عيد الأضحى/Eid ul-Adha) são feriados do Estado, e os timorenses muçulmanos são uma pequena minoria... E o Ano Novo Chinês (農曆新年/Tinan Foun Xina/Tahun Baru Imlek)? Não terão os chineses timorenses direito a pedir também o seu feriado?

segunda-feira, março 10, 2008

Capoeira na Indonésia

As vezes que eu vi este reclame em Timor e na Indonésia...



Gudang Garam é uma marca de kretek, o típico tabaco indonésio misturado com cravinho (Syzygium aromaticum).

sábado, março 08, 2008

Sirana – O início do cinema timorense

As cenas iniciais mostram-nos o interior de uma casa de palapa, um típico lar timorense com uma fotografia do Papa João Paulo II pendurada na parede, um oratório onde rezam os habitantes com uma vela acesa, frinchas nas paredes, cozinha e quarto-de-banho exteriores, também feitos de materiais como palapa ou chapas. Um senhora de lipa e cabaia reza as orações matinais e faz a lida da casa. Ficamos então a saber quem mais mora na casa, Sirana, a protagonista, filha da senhora, e a irmã mais velha daquela e o cunhado. Este está desempregado, é vadio e bêbado, e bate na mulher. As discussões entre o casal são constantes.

Vemos depois Sirana sair cedo a pé com a mãe para irem vender legumes da sua horta no mercado. Aí aparece uma antiga conhecida da mãe, acompanhada por uma jovem colega de Sirana, ambas bem vestidas e com visual moderno. As senhoras conversam um pouco e a que compra os vegetais diz que trabalha num kantor [escritório] e refere as muitas colegas de ambas de antigamente, que são agora deputadas no Parlamento e funcionárias de Ministérios. A cena apresenta, sem tal mencionar explicitamente, o contraste chocante entre a vida de uma que continua pobre e a forma como a outra subiu na vida e se move no mundo dos políticos, dos malais, das ONGs… As duas raparigas andam ambas a ensaiar para uma peça de teatro e combinam encontrar-se lá no CJPAV mais tarde. Sirana interpreta o papel principal, o de Rosa Muki Bonaparte.

Já em casa, aparece a visitá-las uma prima, moça moderníssima, toda gira, transportada de carro. Explica que trabalha com os malais, ganha muito dinheiro, e, inquirida, responde que para arranjar um emprego assim “tem que se saber inglês e português, saber vestir-se bem, ser bonita, e mais outras coisas… que tu [Sirana] ainda não sabes”. Veio contar-lhes que na semana seguinte será o seu “troka prenda”, noivado, e que o namorado é estrangeiro, mas muito boa pessoa, e que no próximo ano irão ambos à terra dele.

Noutra cena, as amigas de Sirana vêm chamá-la para ir com elas à praia. São exuberantes, elegantes e belas, vestem roupas justas com ombros nus e umbigos à mostra… Sirana vai com roupas que a prima lhe havia oferecido. Na praia ela está triste e acaba por desabafar com dois colegas, um rapaz e uma cachopa, contando os problemas em casa entre a irmã e o cunhado, e também que não lhe estão a correr bem os ensaios porque não sabe o suficiente sobre Rosa Muki Bonaparte. Os colegas falam-lhe do papel desta como pioneira dos direitos da mulher em Timor, no âmbito da OPMT, e que foi assassinada pelos militares indonésios no porto de Díli logo no primeiro dia da invasão, e aconselham-na a procurar nos livros e perguntar às senhoras mais velhas. Ela confessa que há mais uma coisa a preocupá-la, um amigo, Nonó, gosta dela, mas ela sente-se reticente em retribuir porque ele é rico e ela não. Eles asseguram que o Nonó é um tipo impecável que não dá importância a essas coisas.

Noutro ensaio, um senhor lá no CJPAV (uma das mais importantes instituições culturais de Díli) pergunta à nossa jovem heroína porque não pede ela à mãe informação sobre a personagem que tem que interpretar e sobre esses tempos. Ele tinha afinal estado no mato com a mãe de Sirana. Esta conta depois à filha sobre os primórdios da luta das mulheres pela sua dignidade, oprimidas que estavam pela sociedade e pela cultura tradicional, e sobre as actividades da OPMT na montanha nos primeiros anos da guerra.

Entretanto o namoro com o tal Nonó parece estar encaminhado. Sirana chega a casa e depara com a irmã que fora novamente espancada.

Temos depois uma cena com a prima, numa esplanada com o namorado. Este é “português”, apesar de o actor falar com um forte sotaque anglo-saxónico:

“- Amor, quando é que me levas para Portugal?
- Fazer o quê?
- Aprezenta ha’u ba ó-nia família [apresentar-me à tua família], of course!
- Querida, ó tenke komprende ha’u tropa ne’e. Ha’u labele lori ó ba Portugál agora. [tens que compreender que sou militar aqui. Não posso levar-te para Portugal agora]
- Mas amorzinho, ó promete atu aprezenta ha’u ba ó-nia família! [tu prometeste apresentar-me à tua família] Sabes perfeitamente que eu estou grávida!
- Eu sei amor. Ne’e la’ós ha’u mak sala. Itrua mak hakarak!... [isso não é culpa minha. Ambos quisemos… ]
- Mas amor…
- Não, não! Ita la promete buat ida ba malu. [nós não prometemos nada um ao outro]
- Ó labele halo ha’u nune’e [não podes fazer-me isso], por favor! “

E o “português” pede desculpa e põe-se a andar. Fica a moça abandonada a chorar. Depois vai a casa das primas contar-lhes lavada em lágrimas.

Este é um drama relativamente comum em Timor, o das namoradas grávidas deixadas entregues à sua sorte por namorados malais que terminam o tempo de serviço e voltam para os seus países. Mas achei curioso que – ainda por cima sendo o actor falante de inglês – tivessem optado por dar ao personagem a nacionalidade portuguesa. É certo que um soldado australiano me contou (não sei se estava a dizer a verdade ou não) que eles estão proibidos de namorar com as timorenses e que por isso, enquanto dura a comissão, têm alguns dias de licença de xis em xis semanas para irem a Báli, mas também é verdade que ele me disse isso num bar e que fiquei com a impressão que ele namorava com uma das empregadas que lá trabalhava…

A história no filme continua a desenrolar-se com a estreia da peça, que retrata a violência da invasão indonésia. As cenas da peça alternam com outros acontecimentos: o cunhado que aparece bêbado mais uma vez e que a sogra expulsa de casa, o reaparecimento deste num estado deplorável andando aos tombos até à porta que ninguém lhe abre. A peça termina com aplausos entusiásticos do público e com a subida ao palco de Mari Alkatiri (na época Primeiro Ministro) para dar beijinhos e cumprimentos aos actores e actrizes.

O filme foi feito em Díli há uns quatro ou cinco anos, e parece-me que é a obra pioneira do cinema timorense. Lembro-me de ter visto pelo menos uma produção antiga com actores da diáspora, “Flores Amargas”, ambientado no meio dos refugiados do Vale do Jamor, em Portugal, mas produto nacional mesmo, este – que eu saiba – é o primeiro. Apesar de algumas dificuldades ao nível técnico, como por exemplo a captação do som que não está muito boa, parece-me um trabalho muito bem conseguido a vários níveis. O primeiro é a sua radicação consciente na realidade local, falado em tétum, não se tratando apenas de olhares de malai sobre Timor mas sim de ambientes e histórias que fazem parte do quotidiano genuíno dos timorenses. Outro aspecto que me agradou foi, que apesar da aparente simplicidade do argumento, há a possibilidade de mais do que um nível de leitura. Resta dizer que Ivete de Oliveira foi a realizadora, e que o filme resulta do trabalho conjunto de várias instituições: Fundasaun Kultural Le-Ziaval, Sahe Institute for Liberation, Sanggar Mamura e Catholic Institute for International Relations, com apoio da Caritas Australia e Caritas New Zealand. Da banda sonora fazem parte pelo menos Os Novos 5 do Oriente e o Nelson Turquel, que também aparecem no filme.


Duas gerações de emigrantes

Duas gerações de emigrantes filipinos na América num vídeo muito bem conseguido.
Qualquer dia começam a aparecer uns telediscos deste género feitos por timorenses em Portugal ou na Austrália, ou talvez da nova vaga de emigração na Inglaterra e Irlanda...

sexta-feira, março 07, 2008

Café pelo mundo

Sendo um viciado em café, lembrei-me de vir à Internet à procura de outros como eu. Encontrei um blog inteiramente dedicado ao Nescafé nos diferentes países do mundo. Alguém pode ajudá-lo com informação sobre Portugal?

Entretanto, fiquem com dois reclames. Um do Nescafé nas Filipinas:



E outro do Nescafé na Indonésia:


quinta-feira, março 06, 2008

Cursos de língua para objectivos específicos

Quando estava em Timor havia colegas malais que de vez em quando iam de férias para a Tailândia. Reapareciam magrinhos, cheios de olheiras, com um ar exausto e um sorriso de orelha a orelha. Inquiridos, abriam ainda mais o sorriso e diziam qualquer coisa sobre terem passado o tempo a ver monumentos.

Em Timor também há quem veja monumentos. Quando cheguei a Díli, em 28 de Abril de 2001, o Instituto Camões pôs-me com a colega que me acompanhava, e os que chegaram depois, a morar no Hotel Starlight, acabadinho de inaugurar. Mais tarde mudaram-nos para outro hotel, o que foi acertado porque uns tempos depois o Starlight mudou de ramo e passou a ser um bordel de prostitutas tailandesas. Uma noite estava a beber um copo num bar e acabei na conversa com o tipo que estava sentado no banco ao lado do meu, um malasiano de origem indiana que se riu quando declarei a minha nacionalidade e me perguntou porque não estava no Starlight com os meus compatriotas todos. Circulavam então por Díli entre a comunidade de expatriados anedotas sobre os magalas lusos que arranjavam namoradas entre as trabalhadoras do estabelecimento e armavam zaragata quando calhava terem licença das suas unidades no mesmo dia dois namorados da mesma moça.

Uma tarde, vinha eu de dar o meu passeiozinho de motorizada ao longo da praia até ao Cristo-Rei, deparei-me com um amigo meu, que tinha sido militar em Portugal antes de ter emigrado para a Austrália. Parei e ficámos na conversa. Ele também tinha encontrado ali na Areia Branca alguns camaradas da mesma tropa que estavam a fazer uma comissão nas Forças de Manutenção da Paz lá em Timor e juntei-me ao grupo. Cada um dos colegas dele estava acompanhado de uma rapariga tailandesa. Elas só tinham expediente à noite e portanto estavam de folga. Eram simpáticas as cachopas, e falavam pelos cotovelos num inglês meio estropiado que no início custava a perceber. Quando expliquei que era professor de português uma delas resolveu impressionar-me com os conhecimentos que tinha da língua, e desatou a dizer, numa sucessão muito rápida, uma enorme lista de termos e expressões que davam conta, no calão mais vernáculo que se possa imaginar, de todas as variantes possíveis de actos sexuais. Suponho que Camões, que tinha fama de entendido em lupanares e era um experimentado viajante dessas ásias por onde os portugueses ergueram o padrão pátrio, teria ficado orgulhoso das acções daqueles militares em prol da difusão da língua portuguesa. E ao ler as referências no Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas a cursos para desenvolvimento da competência parcial num dado idioma no que se refere a um domínio determinado e a tarefas específicas, não posso deixar de pensar que era exactamente disso que se tratava também ali.

domingo, março 02, 2008

Um brinde aos amigos

A vida tem altos e baixos. A felicidade às vezes surge em instantes fugazes, um bater de asas de borboleta e desaparece. Mas de vez em quando damos por nós a ficar surpreendidos por vê-la durar. Eu tive dois períodos na vida em que fui intensamente e consistentemente feliz. Um desde que em Timor comecei a namorar com a Fernanda, a minha esposa, e que ainda continua, renovando-se em cada amanhecer. Outro, na época em que morava na Residência Universitária Ribeiro Santos. Foram tempos de pobreza (ainda ontem ao folhear o Diccionario Teto-Português, de 1907, de Raphael das Dores, me lembrei do que me custou – não me recordo do preço em dinheiro, mas sim que, tendo-o encontrado num alfarrabista lisboeta, andei quase duas semanas a comer só uma refeição por dia para poder comprá-lo), mas também houve muito amor, amizade, solidariedade, e descoberta das coisas importantes da vida.
Os anos foram passando, eu morava do outro lado do mundo, e perdi o contacto com os amigos dessa época. Mas de vez em quando alguma coisa aparece que me faz recordar algum colega desse tempo. O vídeo que se segue, que encontrei no YouTube, fez-me lembrar da Clara. :-)




Se o de cima não funcionar tente este:



OS LÍRICOS

OS LÍRICOS
Sobre amos em Timor e outras construções do imaginário


Quando eu era miúdo era comum entre o meu círculo de amigos chamar a quem tivesse ideias fantasiosas, desligadas da realidade, um “lírico” ou, com mais frequência, um “p… lírico” (em que “p…” era um palavrão sinónimo de “c…”). Eu, que até era um puto bem comportado, evitava o uso do calão (o que fazia de mim uma ave rara entre a miudagem da minha terra), no entanto agora vem-me sempre essa expressão à cabeça quando leio certos textos sobre Timor que pintam uma imagem idílica muito distante da realidade dos factos. Muitos activistas ou simpatizantes da causa da autodeterminação nos anos da ocupação habituaram-se a imaginar um povo de santos mártires e heróicos guerrilheiros imaculados e sentem-se traídos nas suas expectativas quando os timorenses se revelam apenas… humanos. Recentemente encontrei num blogue sobre actualidade timorense muito frequentado trocas de acusações entre leitores que denunciavam ou defendiam a Fretilin com base em factos revelados pelo Relatório da Comissão de Acolhimento, Verdade e Reconciliação sobre violações de direitos humanos perpetradas por aquele partido durante a guerra civil e os primeiros anos da ocupação. Neste tipo de debates é frequente os participantes de ambos os lados assumirem posições radicais de defesa fanática dos seus correligionários e tentarem mostrar os opositores políticos como a encarnação do Mal absoluto. E a verdade é a primeira baixa nessas guerras de palavras. Tem-se visto isso muito na blogosfera e nos artigos de opinião que abundam sobre política timorense recente.
Porém, os textos um pouco mais antigos também sofrem muitas vezes do mesmo mal. Um exemplo que costumo citar é o artigo de Elaine Brière intitulado “East Timor: History and Society”, incluído na colectânea “East Timor: Occupation and Resistance” organizada por Torben Retbløl e publicada em 1998. A autora diz que “antes da chegada dos portugueses os timorenses estavam organizados politicamente em cerca de 46 pequenos reinos independentes, todos livres e independentes uns dos outros(1), ignorando a verdade histórica de que esses reinos se guerreavam frequentemente entre si, e que estabeleciam em muitos casos relações de vassalagem uns com os outros. Mais à frente Elaine Brière declara que em 1974 “crimes como o incesto e a violência contra crianças ou contra a esposa eram virtualmente desconhecidos(2), contribuindo para reforçar uma imagem idealizada de “bom selvagem” que só viria a conhecer o crime e a perfídia com a invasão indonésia.
No mesmo tom temos um excerto de um texto de Maria José Albarran publicado em 2004, de que me lembrei ao ler uma certa passagem numa tradução inglesa do Noli Me Tangere, e que motivou o subtítulo desta breve reflexão. O tal excerto diz respeito à palavra “Amo”, usada pelos timorenses para se dirigirem aos padres:
“Item arcaizante, figura nos dicionários etimológicos e modernos como sinónimo de senhor, dono de criação, patrão de trabalhadores, antigo senhor de escravos, forma de tratamento do soberano pelos cortesãos, mas como masculino de ama, ou seja, sem evolução autónoma de étimo latino. Isto acrescenta-lhe o sentido carinhoso de hospedeiro, educador, pedagogo, já que a ama era tanto a criada que amamenta, como a dona de casa, a governante, sempre uma educadora. Julgo ter sido nesta última especialização semântica que o termo se difundiu, valorizando a vertente pedagoga do clero em Timor.” (3)
Ora, se nas conversas em tétum os timorenses usam habitualmente “amu”, nos textos aparece com mais frequência o composto “amu-lulik” ou a sua forma abreviada “amlulik” (em que “lulik” significa “sagrado”), e “amu-lulik” é sinónimo de “na’i-lulik”. “Na’i” é a forma de tratamento usada para um liurai (rei) ou um dato (nobre), e foi também adoptada para os fiéis se dirigirem a Deus, traduzindo a palavra portuguesa “Senhor”. Diz-nos o Disionáriu Nasionál ba Tetun Ofisiál, monumental obra lexicográfica de referência para a língua tétum com 872 páginas, publicada pelo Instituto Nacional de Linguística em 2005:
amu
substantivu 1. Ema ida ne’ebé ema seluk nia patraun ka xefe. SIN. na’in, patraun
2. Títulu haraik-an ne’ebé ita fó ba patraun, xefe ka amlulik.

amlulik mós amu-lulik
substantivu Mane ida ne’ebé hala’o kultu relijiozu no hanorin kona-ba Maromak. SIN. na’i-lulik, padre

na’i mós na’i-mane
substantivu 1. Mane ida ne’ebé iha fatin aas iha sosiedade, hanesan liurai, dato, emboot ka patraun.
2. Ema-mane ida ne’ebé ita respeita tanba matenek, barani ka oin-na’in. SIN. señór, usi. ‘Na’i Maromak’ ne’e títulu ne’ebé ita ema baibain fó ba Maromak.

na’i-lulik
substantivu Mane ida ne’ebé hala’o kultu relijiozu no hanorin kona-ba Maromak. SIN. amlulik, padre
(4)
Ainda sobre a entrada da palavra portuguesa “amo” para línguas de Timor, encontramos na Revista Missões, publicada em Lisboa pelos Jesuítas, Ano XIII, número de Maio/Junho de 1960, um texto intitulado “Deus em Timor”, no qual podemos ler uma lista de termos para designar Deus em diversos idiomas timorenses que inclui “Amo Deus” em galole, midique e uaima’a. O autor do texto comenta: “Para evitar confusões, introduziram então termos ocidentais, mais ou menos infelizes, como esse do Amo Deus. Mas a língua não teria sequer possibilidades de traduzir o antiquado «amo», patrão ou Senhor? Ou de... o suprimir até?”. Em tétum não houve necessidade de usar neste contexto empréstimos lexicais uma vez que já existia uma palavra para uma entidade de natureza divina “Maromak” que passou a ser usada para o Deus dos católicos, às vezes associada a “Na’i”:
Glória ba Maromak leten aas bá. (5)

Pás iha raiklaran
ba ema sira be Na’i hadomi.
Na’i Maromak,
Liurai Lalehan nian.
Aman Maromak bele halo hotu-hotu
ami hahi’i Ita-Boot
(…)”

Não passa pela cabeça de ninguém negar a importância da vertente pedagoga da Igreja em Timor, mas parece-me fantasioso querer demonstrar que a palavra “amo” não tivesse entrado para as línguas locais com o seu significado de “figura de autoridade”.
Já tenho dito e escrito em diversos locais que a Igreja Católica foi talvez a mais importante instituição na criação e amadurecimento da cultura moderna timorense e de uma identidade nacional diferenciada. Esse papel não cessou ainda.
Benedict Anderson, o celebrado autor de Imagined Communities: Reflections on the Origins of Nationalism e um velho amigo de Timor, publicou em 1993 um texto, baseado numa conferência do ano anterior, de que a revista galega Çopyright publicaria depois em 1999 uma tradução sob o título “Imaginar Timor Leste”. Aí o autor dizia:
A minha percepção é de que em 1974-75 o verdadeiro nacionalismo timorense tinha ainda uma ténue base de apoio; talvez apenas uma pequena percentagem da população pudesse então imaginar realmente o futuro Estado-Nação de Timor Leste. Desde 1975 a situação mudou dramaticamente. (…) Um dos principais projectos do estado de Suharto foi o de "desenvolver" a Indonésia. Isto envolve necessariamente um certo tipo de definição do que significa ser um verdadeiro indonésio. Parte dessa definição decorreu dos massacres anti-comunistas de 1965-66, que foram em parte entendidos como uma luta contra o ateísmo. Em consequência, hoje todo o indonésio tem de seguir uma religião do Livro. Neste ponto, o estado indonésio acaba enredado numa estranha ratoeira. Em 1975 a maioria dos timorenses era ainda animista. Fazer deles "indonésios" significou "erguê-los" do animismo a uma religião decente, o que, dadas as realidades existentes, significou Catolicismo. Ao mesmo tempo, o Estado estava perfeitamente consciente dos perigos da implantação do catolicismo, sobretudo devido ao facto de Roma insistir em tratar directamente com Timor Leste, ultrapassando a conformista hierarquia católica indonésia. Assim, o regime indonésio a um tempo desejou e receou o alargamento da influência do catolicismo. Nos últimos dezassete anos, a população católica do território mais que duplicou de tamanho. Em Timor Leste todos sabem que se se é membro da Igreja católica, beneficia-se de protecção de acordo com a própria lógica do estado; ao mesmo tempo desenvolveu-se um catolicismo popular como expressão de um sofrimento comum, tal como sucedeu na Irlanda do século XIX. Este elemento comum católico num certo sentido substituíu aquele tipo de nacionalismo de que falei noutros lugares, o qual deriva da articulação entre imprensa e capitalismo. Além do mais, a decisão da hierarquia católica em Timor Leste de usar Tetum, e não indonésio, como a língua da Igreja, teve efeitos profundamente nacionalizadores. Transformou o Tetum, de uma língua local ou língua franca em certas partes de Timor Leste, na língua da religião e da identidade de Timor Leste.” [o sublinhado é meu]
Mas, sem deixar de reconhecer o importante papel desempenhado pela Igreja em Timor, não podemos criar uma imagem idealizada e distante da realidade na qual o clero apareça transfigurado em meiga ama-de-leite que exerce o seu labor pedagógico na mais mansa das atitudes. Os timorenses contam muitas histórias sobre venerandos padres famosos por distribuírem chapadas no meio das missas, e nas escolas da Igreja também se continuam a usar ainda hoje (como nas do Estado) castigos corporais. Ao longo da história a Igreja esteve muitas vezes na posição de autoridade mesmo no mundo secular, e a evangelização de Timor não foi isenta de querelas. No livro “Timor Loro Sae - 500 Anos”, o historiador Geoffrey C. Gunn conta-nos sobre disputas no séc. XVII entre os dominicanos já instalados e os jesuítas que pretendiam instalar-se e cita documentos desta última ordem que “sugerem uma actuação criminosa por parte dos dominicanos invejosos, que, tendo vivido ali durante 100 anos, «se recusam a aprender a língua nativa para grande detrimento da salvação do povo. Não impedem os pregadores muçulmanos de islamizar os gentios, mas gostariam de expulsar os outros missionários. Ocupam-se activamente a construir barcos para o seu comércio e a obter lucros, deixando as almas ao abandono».” (pág. 83)
A palavra “amo” como forma de tratamento dos sacerdotes não é de resto exclusiva de Timor. Também existe nas Filipinas, que tal como Timor são uma sociedade católica conservadora culturalmente mestiça ibero-asiática. Vejamos então um trecho de “Noli Me Tangere”, grande romance de José Rizal, nacionalista filipino do séc. XIX fuzilado pelas autoridades coloniais espanholas, no original em espanhol e em traduções para inglês e para tagalog:

«Entretanto el entusiasmo del predicador subía por grados. Hablaba de los antiguos tiempos en que todo filipino, al encontrar un sacerdote, se descubría, doblaba una rodilla en tierra, y le besaba la mano. “¡Pero ahora – añadía- sólo os quitáis el salakot o el sombrero de castorcillo, que colocáis medio ladeado sobre vuestra cabeza para no desarreglar el peinado!. Os contestáis con decir: ¡buenos días, among!9 [Nota 9: Del español 'amo,' señor, usado en tagalog como adjetivo y por lo tanto con la desinencia 'ng.' La frase completa sería 'ámong pare' o 'ámong cura.'], y hay orgullosos estudiantillos de poco latín, que por haber estudiado en Manila o en Europa se creen con derecho de estrecharnos la mano en lugar de besarla... ¡Ah!, el día del juicio pronto viene, el mundo se acaba, muchos santos lo han profetizado, ¡va a llover fuego, piedra y ceniza para castigar vuestra soberbia!”.
Y exhortaba al pueblo a que no imitase a esos salvajes, sino que los huyese y aborreciese, porque estaban excomulgados.
- ¡Oíd lo que dicen los santos concilios! - decía-. Cuando un indio encontrare en la calle a un cura, doblará la cabeza y ofrecerá el cuello para que el among se apoye en él; si el cura y el indio van a caballo ambos, entonces el indio se parará, se sacará el salakot o sombrero reverentemente; en fin, si el indio va a caballo y el cura a pie, el indio bajará del caballo y no volverá a montar hasta que el cura le diga ¡sulung!,10 o esté ya muy lejos. Esto dicen los santos concilios y el que no obedezca estará excomulgado”. » (6)

«In the meantime the preacher’s enthusiasm was growing by leaps and bounds. He referred to the old times when every Filipino on meeting a priest, uncovered himself, bent one knee to the ground and kissed the hand of the religious. “But today,” he added, “he removes only his sakalot or his felt hat, which is tilted one way so as not to disarrange the hair! You are content with saying: Good morning among, master; and there are arrogant estudiantillos who know little Latin who, because of having studied in Manila or in Europe, believe it their right to shake our hand instead of kissing it. Ah! the world is coming to an end; many saints have prophesied it. It is going to rain fire and brimstone to punish your pride!”
And he exhorted the people not to imitate those savages; to flee from them, abhor them, because they are excommunicated. “Pay attention to what the holy councils proclaim,” he said. “When an Indio meets a priest on the street, he must bend his head and offer his neck for the among to lean on. If the priest and the Indio are both on horseback, then the Indio should stop, reverently remove his sakalot or hat; and finally, when the Indio is on horseback and the priest on foot, the Indio should get down from his horse and not mount it again until the priest tells him sulong! begone! Or is already far away. That is what the holy councils say and he who does not obey will be excommunicated.” » (7)

«Samantala nama’y lalong nag-uulol ang sigabo ng kalooban ng nagsesermon. Tinutukoy ang matatandang kapanahunan, noong pag nakasalubong ng isang pari ang sinumang Pilipino ay nag-aalis ng sumbrero, iniluluhod sa lupa ang isang paa at humahalik ng kamay. “Datapwa’t ngayon,” ang dugtong niya, “ay nag-aalis na lamang kayo ng salakot o ng sumbrerong kastorilyo, na inilalagay ninyong pakiling sa ulo, upang huwag magusot ang buhok! Nasisiyahan na kayo sa pagsasabi ng: magandang araw po among! At may mga mapalalong estudiantillos de poco latin, na sa dahilang nakapag-aral sa Maynila o sa Europa ay nag-aakalang nararapat nang kami’y kanilang kamayan at huwag halikan ng kamay…”“Ah…ang araw ng paghuhukom ay nalalapit na, ang mundo’y natatapos na; maraming banal ang humula ng gayon, uulan ng apoy, bato at abo upang parusahan ang inyong kapalaluan!”
At pinangaralan ang bayan upang huwag gumaya sa mga salbaheng iyon, kundi bagkus pa ngang sila’y layuan at kamuhian sapagka’t silay mga excomulgado.“Pakinggan ninyo ang sinasabi ng mga santong concilio!” anya, “kapag natagpuan ng isang Indio sa lansangan ang isang kura ay iyuyuko ang ulo at ihahain ang leeg upang ang among ay makapangalalay; kung ang kura at ang Indio ay kapwa nangangabayo, ang Indio ay titigil, magalang na mag-aalis ng salakot o sumbrero; sa kahuli-hulihan, kung ang Indio ay nangangabayo at ang kura ay naglalakad, ang Indio ay lulunsad sa kabayo at hindi sasakay na muli hanggang hindi siya pinagsasabihan ng: sulong ng kura, o kaya’y malayung-malayo na ito. Ito ang sinasabi ng mga banal na konsilyo at ang hindi sumunod ay eskomulgado.” » (8)


(1) - “Before the arrival of the Portuguese the Timorese were politically organized into some 46 small independent kingdoms, all free and independent of one another.
(2)Crimes such as incest and child and wife abuse were virtually unknown.”
(3) O artigo chama-se “Aprendizagem do Léxico Português e Empréstimos – Timor, restante Sudeste Asiático e Japão” e foi publicado em 2004 na revista do Instituto Nacional de Linguística “Estudos de Línguas e Culturas de Timor-Leste”.
(4) amu
substantivu 1. Pessoa que é patrão ou chefe de outrem. SIN. na’in, patraun
2. Título de respeito que se usa para o patrão, o chefe ou um sacerdote.

amlulik também amu-lulik
substantivu Homem que preside ao culto religioso e que ensina sobre Deus. SIN. na’i-lulik, padre

na’i também na’i-mane
substantivu 1. Homem com uma posição alta na sociedade, como um liurai, um nobre, um governante ou um patrão.
2. Homem respeitado pela sua inteligência, coragem ou hospitalidade. SIN. señór, usi. ‘Na’i Maromak’ ne’e títulu ne’ebé ita ema baibain fó ba Maromak.

na’i-lulik
substantivu Homem que preside ao culto religioso e que ensina sobre Deus. SIN. amlulik, padre

[As traduções são minhas]


(5) Gloria in Excelsis Deo
“Glória a Deus nas alturas,
e paz na terra
aos homens por Ele amados.
Senhor Deus, Rei dos céus,
Deus Pai todo-poderoso:
nós Vos louvamos
(…)”
(6) Da versão em linha http://de.geocities.com/hispanofilipino/Noli/nolitocframe.html acedido em 14 Fev 2007
(7) In “Noli Me Tangere – a novel”, from José Rizal, translated by Soledad Lacson-Locsin, page 211, 212, in Chapter 32 - “The Sermon” [© 1996 Bookmark, © 1997 School of Hawaiian, Asian & Pacific Studies]
(8) Noli Me Tangere ni Jose Rizal, by Teresita P. Capili-Sayo and Cresenciano C. Marquez, Jr., page 161-162, Kabanata 32 – Ang Sermon [© 2000 Phoenix Publishing House, Inc. Quezon Avenue, Quezon City, Philippines] – Agradeço à Jan o envio desta versão em tagalog do texto.