quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Textos antigos

Editoriais do Semanário

Em 2004, durante cerca de um mês e meio assumi em Díli as funções de Director provisório do jornal de língua portuguesa Semanário. O Director fundador, António Veladas, ia ausentar-se do país em férias e propôs-me esse desafio, que aceitei. Por razões que não vêm ao caso, ele acabou por se ver impedido de reassumir a tarefa no momento que havíamos inicialmente combinado, e ficou depois no seu lugar outra pessoa. Os pequenos textos que se seguem são os editoriais que escrevi durante esse período:

Quando o António Veladas me propôs que assumisse as funções de director do Semanário, durante as férias dele, hesitei. São muitos os meus afazeres e a última coisa de que preciso é de ainda mais trabalho. Mas acabei por aceitar, por uma questão de coerência com as posições que tenho defendido. Claro que teria sido muito mais fácil declinar o convite e ficar depois sentado numa esplanada a beber umas cervejas frescas e a dizer mal do trabalho de quem faz alguma coisa, como é hábito de muita gente da nossa praça. No entanto, é muito mais interessante pôr mãos à obra e tentar fazer algo que se veja.
O António teve ainda tempo de deixar preparada a maior parte deste jornal, antes de partir, de forma que a transição se torna mais suave. O jornal da próxima semana será a prova de fogo da equipa que cá ficou a labutar. A linha editorial do jornal irá naturalmente manter-se, com algumas pequenas alterações temporárias, nomeadamente no que se refere à ausência de colaboradores habituais, por motivo de férias. Teremos vários dossiês especiais sobre temas da actualidade nacional, e daremos também destaque à cultura.
O Semanário é um jornal timorense em língua portuguesa, vocacionado essencialmente para o público timorense, no qual trabalham timorenses e malais. Não é um jornal para expatriados. Cumpre uma função de suma importância, enquanto órgão de comunicação social em português, num panorama em que a maior parte dos jornais parece dar mais importância à língua dos indonésios do que às línguas oficiais de Timor-Leste, e em que a televisão nacional transmite programas infantis em língua inglesa.
Tentaremos também marcar uma diferença pela forma de relatar os acontecimentos, evitando o sensacionalismo fácil, que só serve para assustar a população. Como aconteceu no início da semana, quando uma manifestação na capital em que estava presente cerca de meia centena de pessoas se viu transformada nas palavras de alguns órgãos de comunicação social no dia seguinte num movimento de quinhentos ex-guerrilheiros.

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 29, 24 de Julho de 2004


Muitas nações recém-independentes após terem sido colonizadas por outras potências tiveram que se defrontar com um dilema: o que fazer com os seus combatentes da liberdade? Nalguns casos, como por exemplo em países da África lusófona, a opção foi frequentemente dar-lhes lugares no aparelho de Estado, transformando bons comandantes guerrilheiros em maus ministros, secretários de Estado e directores-gerais. Timor-Leste parece ter aprendido alguma coisa com os erros dos outros, fugindo à tentação de premiar o mérito dos antigos comandantes e combatentes das Falintil com lugares nas estruturas do Governo, a não ser que os próprios demonstrem capacidades próprias para a função. Mas isto faz surgir um outro problema: como premiar então homens que abdicaram de tudo - da vida familiar, do aconchego de um lar e de um tecto sobre as suas cabeças, de uma vida de relativa segurança com salário ao fim do mês - para se dedicarem ao ideal da independência da pátria e da liberdade para o seu povo?
A entrada para as FDTL, já não um exército guerrilheiro de libertação, mas uma tropa moderna com outro tipo de objectivos, foi condicionada a um processo de selecção que deixou de fora alguns dos ex-combatentes do tempo da ocupação. Para esses, espera-se que o novo Estado saiba encontrar formas simbólicas, mas significativas, de lhes demonstrar que não foram esquecidos e que a Pátria tem consciência do que lhes deve. Não são tantos como às vezes se diz, e há comissões que estão a reunir os dados necessários para saber realmente quem são. Homens como Xanana Gusmão, Taur Matan Ruak ou Lu Olo conhecem-nos, andaram com eles no mato.
Há quem diga que a UIR [Unidade de Intervenção Rápida da Polícia] estava ansiosa para testar os equipamentos e que usou força excessiva para afastar os manifestantes do Palácio do Governo na semana passada, tendo em conta que eram poucos e estavam desarmados. É uma opinião discutível, o gás lacrimogéneo dá muito nas vistas mas é altamente eficaz para afastar as pessoas sem ser preciso usar violência.
O que não é discutível é a gravidade das acusações feitas à PNTL de tortura de detidos na sequência da manifestação. Sendo Timor-Leste um Estado de Direito, espera-se agora que, para além dos processos disciplinares na própria instituição, os alegados torturadores sejam julgados em tribunal para averiguar da verdade das acusações. Não é admissível que a PNTL possa usar os métodos de interrogatório que eram habituais por parte das forças de segurança indonésias, na época da ocupação.

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 30, 31 de Julho de 2004


Regras no trânsito
Ontem à noite (sexta-feira, 6) fui mandado parar numa operação-stop da Polícia ao lado do Edifício ACAIT. Como circulava sem os documentos da motorizada, esta foi apreendida, e terei que pagar uma multa para a reaver. A minha motorizada é uma daquelas em “não-sei-quanta-gésima” mão, que foi sendo revendida de malai para malai ao longo dos últimos anos, e cujos documentos algum dos proprietários perdeu entretanto há muito tempo. Claro que me causa transtorno, mas encarei o percalço pelo lado positivo, isto parece significar que as regras de circulação na estrada estão a ser aplicadas e que Timor-Leste vai deixar de ser o “faroeste”, uma terra sem lei, no que se refere ao trânsito. No momento em que fui mandado parar havia já lá umas vinte motorizadas apreendidas aos seus condutores, e “ainda a noite era uma criança”. Resta mencionar, porque também deste tipo de pormenores se faz a imagem de um Estado, que os agentes da PNTL envolvidos na operação com os quais tive contacto mantiveram sempre uma postura de cortesia e profissionalismo.
Crianças mendigas
Durante séculos nos relatos de viajantes e missionários os timorenses foram descritos como um povo digno, altivo, que se recusava à mendicidade. Em 1999, os jornalistas aqui chegados para cobrir a chegada da Interfet ficaram assombrados com a total destruição da cidade. Num contexto em que faltavam quase todos os bens essenciais, os repórteres escreviam para os seus jornais e contavam nas suas rádios e televisões que os timorenses, apesar das dificuldades, não pediam esmola. Falavam com admiração sobre um povo orgulhoso. Cinco anos de presença dos “internacionais” mudaram radicalmente tudo isso, e agora basta passar em frente dos restaurantes onde os malais costumam comer para encontrar dúzias de crianças a mendigar dinheiro. Alguns dizem “Security, security”, como se meninos e meninas daquela idade pudessem proteger os carros ou motorizadas se alguém pretendesse roubá-los. O trabalho infantil é um mal, mas seguramente um mal menor do que a mendicidade infantil. Se uma criança tem que andar a vender isqueiros ou CDs para ajudar no orçamento familiar, pelo menos sempre vai aprendendo o valor do trabalho, e se tiver pais conscientes, será incentivada a aplicar-se nos estudos para poder ter uma vida melhor. As crianças de rua não assumem ainda as proporções de lugares como o Brasil ou Moçambique, mas é melhor que se faça alguma coisa ou estaremos a formar uma geração de pedintes. Se um destes pequenos mendigos conseguir que os malais que pensam estar a ser o bom samaritano lhe dêem por dia uns três dólares ganhará tanto como um funcionário público no fim do mês. Quem é que o convence depois a ir para a escola estudar para ter uma vida diferente?

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 31, 7 de Agosto de 2004


A sétima edição do guia de viagens Lonely Planet sobre a Indonésia, publicada em Novembro de 2003, diz num texto assinado por um ignorante qualquer chamado Nick Ray (na página 33) que o Primeiro-Ministro Mari Alkatiri escolheu o português para língua oficial e que foi uma má escolha. O senhor que escreveu tal prosa passa por cima das decisões da Assembleia Constituinte democraticamente eleita em eleições organizadas pelas Nações Unidas, ignora as posições sempre oficialmente defendidas pelo CNRT, esquece as declarações de princípio dos partidos políticos deste 1975 até à independência, não tem em conta que o povo timorense elegeu os seus representantes sabendo de antemão que oficializar a língua portuguesa fazia parte do programa dos seus partidos.
Este tipo de declarações incorrectas é corrente em muitos meios de comunicação social, especialmente no mundo anglo-saxónico. Por outro lado, na minha terra costuma dizer-se “os cães ladram, mas a caravana passa”. Não creio que a opinião do senhor Nick Ray seja para levar a sério. Preocupa-me mais a atitude que persiste em certos jovens, que se queixam continuamente de que “o português é muito difícil”. Preocupo-me não pelo facto de eles não aprenderem português – há muitos outros que aprendem e quem fica a perder é quem fica parado – mas pelo que isso mostra da sua atitude perante a vida. Os argumentos deles deixam-me perplexo. Agora há quantidades enormes de livros e dicionários modernos distribuídos por todo o lado em Timor, incomensuravelmente mais do que alguma vez houve no tempo da administração colonial portuguesa. Há professores de nacionalidade portuguesa com cursos superiores de ensino de línguas espalhados pelo território, enquanto na época colonial não havia cá universidade, muitas das professoras do Liceu eram as esposas dos militares aqui colocados, muitas crianças aprendiam a ler e a escrever nas escolas primárias da “psico-social” onde o professor era muitas vezes um militar com a quarta classe que lá ia fazendo o que podia, mas não tinha preparação adequada para a função. Dizem que não falam português em casa; no tempo dos portugueses havia poucas famílias em que a língua de casa fosse a portuguesa. O maior escritor que Timor já produziu, Luís Cardoso, escreve com mestria em português, mas só aprendeu este idioma quando entrou para a escola, como as outras crianças com quem brincava. Conheço aqui muitos timorenses com o quinto ano antigo (equivalente à escola pré-secundária), ou mesmo com a quarta classe, que falam português fluente, apesar de quase não poderem exercitá-lo durante um quarto de século. Conheci um senhor, na época motorista no escritório da Comissão Europeia em Díli, que domina a língua portuguesa e que me contou que tinha aprendido no mato com a Fretilin, nos primeiros anos da ocupação, escrevendo na terra e nas cascas das árvores. Conheço pessoas, jovens e menos jovens, que aprenderam a falar português com correcção desde 1999 até agora. É que já passaram cinco anos. Muitos dos que ficam a protestar que a língua portuguesa é difícil sabem agora o mesmo que sabiam nessa altura. Isso deixa-me confuso: o que esses moços e moças querem dizer é que têm uma capacidade intelectual menor do que a da geração dos pais e avós deles? Ou simplesmente não lhes apetece fazer pela vida, e daqui por uns anos irão fazer manifestações quando os colegas mais diligentes arranjarem emprego e eles não?

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 32, 14 de Agosto de 2004


Há uma Igreja em Lisboa onde vi uma vez um cartaz colado à entrada que dizia “Deus chama-o mas não através de telemóvel. Por favor desligue o seu ao entrar na Igreja.” Já repararam como o telemóvel passou a ser dono e senhor da vida de muita gente? Eterno intruso, sempre a desconcentrar-nos do trabalho, a acabar com o nosso sossego, a meter-se com a nossa privacidade... Sim, claro que é muito útil, mas deve ser um servo e nunca um senhor. Hoje em dia há pessoas que nunca desligam o seu, vão para reuniões que não devem ser interrompidas de telemóvel ligado, vão para as aulas de telemóvel ligado, até para os exames... E os colegas que sofram enquanto a maldita maquineta toca em acordes agudos uma cantiga qualquer que esteja na moda. E muito poucos utilizadores parecem ter descoberto já que os aparelhos endiabrados têm um comando para os pôr no silêncio de forma a não perturbar ninguém. Depois há aqueles, talvez deva dizer principalmente aquelas, que têm coragem de ficar a namorar pelo telemóvel no lugar de trabalho enquanto o cliente espera à sua frente para ser atendido. E já tentaram manter uma conversa decente com um(a) jovem moderno(a) de aparelho na mão a jogar “Snake” sem parar ou a mandar e receber mensagens “sms” ininterruptamente? Não é coisa para dar cabo dos nervos de um cidadão pacato e pouco dado a emoções fortes?
Acho que está a chegar a altura de eu ir viver para algum lugar como Hatu Builiku. Parece que os telemóveis lá ainda não funcionam...

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 33, 21 de Agosto de 2004



A Ministra Ana Pessoa está de parabéns por ser a única pessoa que fala regularmente em língua portuguesa na TVTL, para além de alguns discursos de Xanana Gusmão por vezes também neste idioma. Com efeito, não se compreende muito bem porque não há mais presença da língua portuguesa na televisão nacional, sendo esta uma das línguas oficiais do país, a única que está com carácter definitivo já no sistema de ensino (a língua dos indonésios só continua a ser língua veicular nas escolas como medida provisória, e os currículos do tétum ainda estão a ser desenvolvidos) e sendo o idioma em que o Parlamento produz a legislação nacional. Como os responsáveis da televisão parecem achar que falar ou escrever português é pecado, colocam também todas as legendas numa algaraviada macarrónica que pretende passar por tétum, e acaba por nem ser tétum nem português, mutilando inclusivamente com o maior despudor o nome oficial das instituições do Estado, como Ministérios ou Secretarias de Estado (cuja designação é habitualmente em língua portuguesa). Sendo a televisão nacional um serviço público talvez fosse útil se ajudasse os cidadãos a conhecerem o nome correcto das instituições nacionais, em vez de “desajudar”.
Tem sido mencionada por vezes por alguns responsáveis timorenses a possibilidade de se solicitar que a RTP internacional passe a ser reemitida aqui como um segundo canal de televisão disponível vinte e quatro horas por dia, como acontece com a RTP África nos países africanos lusófonos. Isso seria algo de bastante útil, aprender as línguas oficiais do Estado é não apenas um dever patriótico mas também um direito de cidadania, e ter programação disponível em português na televisão é uma ajuda importante para quem está a aprender a língua.
Outra medida bastante produtiva seria pedir à RTP a cedência de programas infantis de qualidade como a Rua Sésamo, para emitir na TVTL em horas adequadas para as crianças poderem ver. Actualmente vejo por vezes programas para as crianças em inglês na televisão, e não duvido que seja muito giro e útil aprender essa língua, mas não creio que seja a prioridade mais urgente para as meninas e meninos que andam a esforçar-se na escola para dominar o português.

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 34, 28 de Agosto de 2004


Com este número chega ao fim a minha curta passagem pelo Semanário como Director. Foi um desafio interessante, mas chegou a altura de voltar à normalidade. E a normalidade para mim não é dirigir um jornal, não sou jornalista, nem tive nunca pretensões de sê-lo. Sou professor, o que talvez tenha influenciado os assuntos tratados pelo Semanário durante este mês e meio, e os textos escolhidos. É-me naturalmente mais fácil falar do que conheço... Sou professor, e estou cheio de trabalho na Universidade, o que levou a que o meu trabalho voluntário me “tenha saído do corpo”, custou-me pelo menos duas “directas” (noites sem dormir) por semana a trabalhar. Mas não tenho nada que me pôr com lamúrias porque só aceitei porque quis. Continuo de resto a manter a mesma posição de princípio: é muito importante existir um jornal de língua portuguesa em Timor-Leste. O Semanário conseguiu ao longo da sua existência uma posição de relevo na sociedade timorense. A compra de um milhar de exemplares todas as semanas pela Cooperação Portuguesa é garantia de que conseguimos fazer chegar o jornal também aos distritos, já que esses mil jornais são depois distribuídos através dos professores portugueses e dos superintendentes da educação a professores timorenses por todo o país. Mas há muito por fazer ainda, principalmente no que se refere a recursos humanos. É um trabalho monstruoso se concentrado em poucas mãos, os jornalistas não dominam o português e escrevem em tétum ou indonésio, os textos passam depois para tradutores, e finalmente voltam a ser revistos... pelo Director. Se o Director tem outras coisas para fazer tudo isto se torna mais complicado, como o leitor pode verificar neste número. Os jornalistas estão a estudar português, e terão que o dominar, talvez numa fase posterior o jornal possa recrutar mais, ou receber estagiários de cursos que funcionem em língua portuguesa na universidade, mas para agora daria jeito ter alguns voluntários que fizessem tarefas como a revisão de textos em língua portuguesa. E termino como comecei: é melhor pôr mãos à obra do que ficar sentado a dizer mal de quem faz alguma coisa, é melhor acender uma vela do que maldizer a escuridão.
P.S.Já depois de ter escrito este editorial, o António telefonou-me a dizer que tem uma costela partida e vai chegar cerca de uma semana mais tarde do que o previsto. Isso significa que o meu caríssimo leitor vai ter que me aturar aqui mais uma semana. Só mais uma.

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 35, 4 de Setembro de 2004


Pirataria
Na Indonésia é difícil encontrar à venda filmes e CDs de música originais, em Timor-Leste é quase impossível. Quase tudo o que existe no mercado local é contrafeito, falsificado, ou seja, produtos-”piratas”. Isso é uma situação que ninguém tem interesse em mudar, se quisermos falar com franqueza, a não ser os artistas timorenses, que saem prejudicados, mas estes não constituem um grupo de pressão significativo. A realidade é que a situação actual é a única que permite que um cidadão leste-timorense (ou indonésio, já que os CDs piratas que se encontram em Timor têm aí origem) tenha poder de compra para adquirir filmes recentes ou CDs de música. Um CD áudio original que em Portugal custa para cima de quinze dólares obtém-se aqui em versão pirata por um dólar, um DVD que lá tem um preço que pode ultrapassar os trinta dólares encontra-se em Timor-Leste por menos de três dólares. Neste contexto é com muita satisfação que vemos como o mercado timorense está inundado de CDs e VCDs piratas de música dita portuguesa (deveria antes chamar-se música lusófona, porque a maior parte dela é em língua portuguesa, sim, mas oriunda de países como o Brasil, Angola, Cabo Verde...). Os empresários que se dedicam a ir fazer cópias contrafeitas à Indonésia não trabalham por projectos políticos ou sonhos ou ideais nacionalistas, eles investem na reprodução de milhares de cópias dessas músicas porque sabem que existe procura por parte dos consumidores timorenses. Isso revela como aspectos culturais e gostos musicais do mundo da lusofonia fazem parte integrante da actualidade nacional, e nunca deixaram de fazer, apesar de todos os esforços da Indonésia para suprimir esse importante traço da identidade de Timor-Leste.
Baby sitting
Em Timor quando um casal que tem filhos pequenos resolve ir jantar fora, ou dar um passeio romântico a ver a lua e as estrelas na praia, as crianças ficam com os irmãos mais velhos, ou com os avós, ou com os tios, ou com a crioula, ou com uma ama (ou nalguns casos, o marido prefere deixar a esposa em casa a tomar conta dos filhos e vai jogar às cartas com os amigos, ou para os copos, ou tentar engatar as moças que trabalham nos bares). Em países como a Austrália, EUA, e em Portugal nas grandes cidades, onde a família alargada foi substituída pela família nuclear de pai, mãe e um ou dois filhos apenas, a solução costuma ser arranjar uma jovem, habitualmente estudante, que fica umas horas a tocar conta dos meninos. Esse trabalho chama-se baby sitting. Foi isso que estive a fazer com o Semanário, mas agora chegou o momento de entregar a criança ao pai.
Agradeço a quem fez a gentileza de ir lendo o que aqui fui escrevinhando, e agora que me retiro prometo continuar a entregar uns textos de vez em quando ao Director, como contributo para este projecto que me parece de muito mérito.

Semanário [jornal em língua portuguesa publicado em Díli] nº 36, 11 de Setembro de 2004